segunda-feira, junho 30, 2003

Não é o que acontece, é como vemos o que acontece

O mundo simplesmente gira, hora se virando para o sol, hora para o resto do espaço infinito. Enquanto isso a gente aqui embaixo tenta dar um sentido a tudo isso! Nos envolvemos em nossos ideais e nos entregamos às reações mais apaixonadas! ;-)

Agindo conforme forças que não conseguimos compreender a realidade se molda aos nossos olhos muito mais do que nos moldamos a ela; e belo o mundo nos parece se com beleza o olhamos, perigoso e hostil se com medo e hostilidade o fitamos.

Não se trata da ingênua filosofia de Polyana, mas de compreender que as boas e as más coisas sempre estiveram ai. Obstáculos a superar, e mesmo as boas coisas podem ser obstáculos pois podem nos tornar acomodados; ou estímulos para ir adiante, e mesmo o "mal" pode ser um trampolim para a superação!

Talvez o Edem de onde pensamos ter vindo e o Paraíso para onde desejamos ir sejam os nossos maiores obstáculos, visões deturpadas da realidade que nos condenam a ver nossa vida como uma eterna luta contra a insatisfação que só nos deixará na morte... Brrrrr... Que tenebroso! Bem melhor é esquecer estes sonhos de perfeição e descobrir a alegria de vencer as dificuldades e desfrutar das facilidades! ;-)

domingo, junho 29, 2003

Senhores das moscas

Ainda o festival Dança em Trânsito, fonte de histórias para muitos diários! Lagoa Rodrigo de Freitas, um público mais diversificado e culto que o da Barra, mas ainda menos comovente que o da Cinelândia.

Durante o festival provavelmente alguns milhares de pessoas tiveram seu primeiro contato com a dança contemporânea e descobriram uma nova forma de lazer e prazer que distrai sem alienar ao contrário de grande parte do entretenimento moderno. Crianças de menos de um ano compenetradas, interjeições emocionadas e aplausos animados se espalhavam ao redor dos espetáculos da mesmo forma que aconteceu nos outros lugares do festival. Entretanto em toda cesta há frutas passadas... Na Cinelândia eu não vi, mas devia existir. Na Lagoa vi apenas um grupo assim...

Reclamavam exaltados contra a invasão da sua quadra de basquete, faziam pouco da dançarina francesa que se preparava para se apresentar, esboçaram muchocos e pirraças durante a apresentação e voltaram ao seu jogo de basquete assim que os 6 minutos do espetáculo terminaram. Voltaram ao seu jogo como fazem todo fim de semana, por uma, talvez duas décadas, até mais já que alguns já beiravam os 60 anos.

Enquanto a grande maioria das pessoas buscava o novo e espandia seus horizontes aquele grupinho permanecia ali preso em seus costumes diários (saudáveis ao menos, devemos reconhecer!).

Fiquei imaginando o que deve ser uma vida assim: nascer, estudar, se divertir, trabalhar, se divertir, envelhecer, se divertir, morrer... Jamais se atrever a uma experiência nova, olhar de um ângulo diferente, se reinventar de vez em quando!

Assim são as moscas: sua vida é muito efêmera e termina antes que possa experimentar algo além do vôo entre uma lixeira e outra...

sábado, junho 28, 2003

Cultura onde o povo está

Era inevitável acompanhar as apresentações do festival Dança em Trânsito e assim fui parar na Barra da Tijuca, Shopping Downtown.

Embora a maior parte do público gostasse dos espetáculos havia uma quantidade de pessoas surpreendentemente ignorantes. Uma voz atrás de mim sugeriu que se desse esmola para o dançarino negro que fez um dos melhores espetáculos do festival, mais adiante um grupo parecia orgulhoso da sua incapacidade em entender a arte dos espanhóis do Provisional Danza.

Por um lado é animador ver como o povo mais numeroso da Cinelândia e do Meier bebe da arte com deleite, por outro lado preocupa notar que, entre os que possuem mais recursos, dirigem (ou virão a dirigir) jornais, radios, emissoras de TV, empresas médias ou pequenas, enfim, a economia do país, esteja a maior concentração de pessoas sem cultura...

Onde estaremos errando? O que molda negativamente nossa burguesia? Todos tem acesso a TV aberta,seria culpa dos canais por assinatura? Acho que não... Dos colégios? Do cinema? Videogames? Não...

sexta-feira, junho 27, 2003

Cinelândia

Pesados ônibus somam o silvo das suas portas ao barulhento movimento do centro da cidade, vozes que se confundem, apitos, motores acelerados, buzinas e o farfalhar pálido das asas dos pombos. Sons que se misturam ao caos visual das pessoas que passam apresadas, roupas coloridas e pernas que se confundem entre a floresta de outras pernas, roupas, quiosques de cachorro-quente e paredes de pedra e concreto.


Então do meio da cacofonia visual e auditiva se levanta uma melodia. Nas escadas do teatro municipal bailarinos imitam a multidão que até a pouco cruzava a praça entorpecida e, entre eles, uma bailarina destoa procurando despertá-los.


Assistindo a tudo isso uma platéia com cara de Brasil: do mendigo ao boy passando pelo admirador de arte. Todos hipnotizados, acompanhando pela praça as outras companhias de dança. E há quem diga que brasileiro não tem cultura! Só fez falta a presença das grandes emissoras de TV o que nos faz pensar... Afinal a quem será que realmente falta cultura?


Sinal


Os carros param e os pedestres ocupam a faixa branca, dançando, vagando entre os veículos e contando suas histórias de encotnros e desencontros, ou, simplesmente, buscando naquelas massas metálicas um pouco das formas orgânicas e vivas que tanto fazem falta nos rostos que cruzam assustados as ruas das grandes cidades.


Sono


A multidão espera o próximo número, os bailarinos seguintes quando um homem e sua mochila passa a chamar a atenção, destacando-se sutilmente dos outros, encosta em um banco e dorme... Logo um segundo homem, encosta-se e dorme. Depois uma mulher, numa árvore: dorme...


Os pedestres, convertidos em platéia e figurantes, passa a seguir o trio sonolento pela praça, divertindo-se com o inusitado da situação: as pessoas que entram no meio da trama sem perceber, as que se vêem subitamente envolvidas.


Mas quantas vezes vagamos sonolentes, até que ponto não estamosali caricaturizados pelo hilário trio?

domingo, junho 22, 2003

A insurgência compulsiva e a simplicidade da vida

- Alô?

- Ah! Meu amigo! Estou me sentindo tão sozinha...

Do outro lado da linha uma das mulheres mais inteligentes e cultas que tive o prazer de conhecer. Amiga querida, brilhante e admirada incondicionalmente. Sozinha...

A política de Lula, a intricada rede que forma a moderna estrutura de poder, produção e força de trabalho, o comportamento artificial que a maioria de nós tem no esforços de fazer o outro aceitar o que gostamos de pensar que somos e o esgotamento do modelo capitalista devorador de recursos... Por quase duas horas vagamos em acalorada discussão.

Desligo o telefone e encaro o vazio branco da parede... No final estamos todos presos aos nossos modelos de vida: os capitalistas, cegos, exploram inconsequentemente; os sindicalistas (sonhando secretamente com a opulência capitalista) permanecem hipnotizados pelo fim dos tempos, ilusório ou talvez não; nós, os insurgentes compulsivos rejeitamos qualquer chão procurando eco no Demian de Herman Hesse. A vida entretanto, temo admitir, é muito mais simples... É procurar ter os recursos básicos para viver enquanto o destino tece a tapeçaria da evolução apesar dos nós nas linhas...

quarta-feira, junho 18, 2003

Enquanto isso, num braço da Via Láctea...

- E se o sol se apagasse? Por magia, sei lá! O que a gente veria no céu?

Foi ao notar que 80% das pessas respondem que fica tudo escuro enquanto 10% acha que a lua permanece lá nos observando com sua complacente palidez que decidi falar de vez em quando sobre este universo por onde singra nosso Sol nos arrastando junto.

Perdidos em nossas vidas diárias nem imaginamos a incrivel vastidão cósmica e, muito menos a importância disso para nós, entretanto é importante, sim, saber nossa real dimensão e papel na dança da realidade.

Imaginando que a fantasia de Matrix é real podemos nos questionar se faz sentido ser ganancioso (tema aliás bem melhor aproveitado em Simulacron 3, pai de Matrix), no entanto a realidade do cosmo é muito mais deslumbrante.

A propósito, o Sol está distante da Terra uns 8 minutos luz, isso significa que (se deixarmos de lado pequenos problemas gravitacionais e, digamos, explosivos) se o Sol desaparecesse nada mudaria por uns 8 minutos, depois disso a lua sumiria dois segundos depois do Sol. Os outros planetas visíveis se apagariam um a um de acordo com a distância da Terra deixando apenas as estrelas...

segunda-feira, junho 16, 2003

Comunicação

O Cristo Redentor se destaca contra o céu negro da Cobal do Humaitá, numa mesa de PVC cinco homens exibem seus corpos bem moldados, ombros largos, músculos hipertrofiados. Suas vozes sobem acima do ruido de fundo, grunhindo chamados para o garçon, risadas ruidosas e poucas palavras inteligíveis.

Lolita anime

As portas do metrô se abrem na estação Cinelândia para nos dar acesso. Todos os bancos ocupados, algumas pessoas de pé sozinhas ou conversando moderadamente.

Sentada atrás do último banco a menina se entretém trocando o cadarço do tênis. As calças boca-de sino, a blusa curta de malha vermelha (deixando a barriga esposta) sob o casaco jeans, cabelos castanhos claros, bem curtos e encaracolados presos por uma faixa vermelha.

Observando atentamente a cena um senhor contrasta seus quase setenta anos com os treze da menina que, a todo momento expreme uma bala do tubinho que leva na mão junto com o velho cadarço branco que acaba de trocar por novos pretos.

A menos de um metro do homem seu rosto expressivo parece ignorá-lo, seus olhos giram pelo vagão, o olhar se perde no chão, através dos vidros escuros, nos cantos do vagão: observam sem ver, como se apreciassem a paisagem enquanto os pensamentos vagueiam pelas vastas planícies da imaginação juvenil.

As portas se abrem e ela se vira com a nota de dez reais para o cinema na mão e segue seu caminho para o shopping deixando apenas a lembrança dos olhos pequenos e cheios de vida, dos dentes dentuços e as fantasias dos anciões.

domingo, junho 15, 2003

Arquimedes

Eureka! Eureka!

O sábio Arquimedes se levanta nú entusiasmado com sua brilhante conclusão e assim vai pelas ruas.

Bem, considerando que na época os esportes eram praticados assim: sem roupas, até que não é um fato tão inusitado, em todo caso era este mesmo senhor que afirmava poder mover o mundo se tivesse uma alavanca e um ponto de apoio suficientemente grandes...

Pois hoje mais vale o apoio dos amigos e a alavanca do espírito livre para mover o vasto mundo particular que cada um de nós aprendeu a criar.

Isso faz lembrar Demian, o do Herman Hesse. Aquele que tinha os olhos perdidos no vazio e não tinha chão sob os pés e portanto estava pronto para a mudança que viesse. Era o medo das indefinições do pós guerra!

sábado, junho 14, 2003

Ser, ter, agir...

Ser ou não ser... será esta a questão? Shakespeare pode ser o inventor do humano que se analisa e busca se compreender, mas já são mais de quatrocentos anos de crises existenciais e auto-questionamentos. Estamos soterrados em livros de auto-ajuda, mas andamos pelos cantos das calçadas com medo uns dos outros: medo do menino de rua, do traficante, do policial, do tarado, da lenda urbana! medo...

Entrando e saindo dos shoppings vemos belos carros e gente bem vestida que se alivia da realidade comprando e se divertindo ainda que tenha insônia por causa de contas a pagar.

Sentados nas esquinas jovens de baixa renda se rendem aos rituais de acasalamento.

Diante de uma telinha de TV, cercada pelo barro seco do sertão uma família sonha com o glamour das grandes cidades sem jamais saber o que significa glamour.

Outros 25% que habitam as estatísticas vivem na latitude zero, sem ao menos a tela luminosa para alimentar seus sonhos e só lhes resta a noite que cai cedo ao redor dos lampiões.