quarta-feira, novembro 13, 2002

Altares Pagãos

Sempre a velocidade e seu impacto na percepção...
Sob a Rocinha, a maior favela do Rio de Janeiro (e uma das maiores do mundo), passa um longo túnel, uma caverna que atravessa as entranhas da Terra. Um reino para toneladas de automóveis de metal e vida alguma, vida alguma....
Entre os túneis no entanto há várias aberturas que os ligam e numa delas, enquanto o ônibus se arrasta pelo engarrafamento vejo o chão coberto de restos de revistas, alguns utensílios que não posso identificar... é um tipo de ninho ou toca de gente. As coisas distribuidas com o carinho de quem monta sua casa, lá emcima, na Rocinha alguém muda a sua tevê de lugar para pendurar na parede tosca um quadrinho do filho que acaba de se formar no segundo grau, em um duplex em São Conrado, logo ao lado, quatro carregadores entregam um piano de cauda. Enquanto isso ali, no segredo abafado da caverna artificial alguém construiu seu espaço ao redor de um buraco na parede, sim há um sugestivo buraco na parede por onde uma pessoa passaria.
Observando atentamente vejo uma pequena estátua de pé, negra como carvão , olhando para o buraco e então percebo ao seu redor o que parecem oferendas. Então não é uma casa para pessoas, mas uma casa para Deuses, um altar a uma fé tida como esquecida e que reinava em cavernas dezenas de milhares de anos atrás...